O Samba
Por Avana Salles
“O Samba”. O nome do filme, por si só, já é auto-explicativo, mas seu diferencial está no olhar do diretor sobre o assunto, o francês Georges Gachot. Elemento tão presente na nossa cultura popular, esse estilo musical ganha nova percepção sob olhar estrangeiro. Gachot consegue transformar um tema já saturado em algo novo, produzindo um documentário alegre e rico em história.
E talvez seja essa a essência do filme, o posicionamento do estrangeiro sobre algo genuinamente brasileiro, uma óptica além do corriqueiro. A visão de quem está de fora, de quem não está acostumado com as situações e, por isso mesmo, consegue converter em novidade o que já está fielmente inserido na nossa brasilidade.
Para nortear o enredo, Martinho da Vila guia o espectador pelas vielas, bares e ensaios de bateria na Vila Isabel – tradicional bairro da zona norte carioca, conhecido por ser um dos berços do samba no Brasil. Ao destacar a comunidade, o diretor mostra que o samba, além de um gênero musical, também é um estilo de vida e faz parte do dia a dia de seus moradores.
Nesse aspecto, Gachot transparece um posicionamento mais sensível, o diretor valoriza mais o envolvimento das pessoas com a escola do que o próprio carnaval. Cenas do desfile e a desenvoltura da Vila na avenida são descartadas, dando espaço para os personagens da comunidade que ganham voz para falar e demonstrar sua integração com a escola. As cenas iniciais fazem jus ao trecho da melodia Renascer das Cinzas, de Martinho da Vila, “mostrando pro povo que o berço do samba é em Vila Isabel”.
O que também chama a atenção no documentário é a preocupação da produção em não cair em um denominador comum. Além de demonstrar as origens do samba, a obra preocupa-se também com mais dois fatores igualmente importantes: as transformações históricas e culturais do estilo musical e a análise da fonte de inspirações para letras, enredos e melodias.
Para exemplificar as mudanças sociais, nas quais demonstram a aceitação do gênero, tradicionalmente popular, para as classes mais altas – o diretor escolhe cenas de consertos de Martinho pelo Brasil, acompanhado de orquestras. Além da passagem do compositor por Paris, onde o músico grava uma canção em conjunto com uma cantora francesa. Para complementar a análise desse processo sócio-cultural, o documentário conta com depoimentos de personalidades como Nana Mouskouri, Mart’nália, Ney Matogrosso, Leci Brandão, Zeca Baleiro e Beth Carvalho.
Uma belíssima sintonia de fotografia com trilha sonora. Impossível não batucar os pés no chão, involuntariamente, por alguns instantes.