A Pedra de Paciência

Por Gabriel Fabri

“Tudo o que você jamais ousaria falar para alguém, conte para a pedra. Quando ela quebrar, você será livre”. Esse é o conselho que a protagonista de “A Pedra de Paciência“, dirigido pelo afegão Atiq Rahimi, recebe de sua tia. No caso da muçulmana interpretada por Golshifteh Farahani, vencedora do prêmio de melhor atriz no Festival Internacional de Abu Dhabi, a tal pedra é o seu marido moribundo. E ele terá que ouvir tudo o que nunca esteve disposto a escutar.

Com o bairro em guerra, alvo de mísseis, de rebeldes e de saqueadores, a personagem de Farahani, cujo nome nunca é revelado, vê-se sozinha para cuidar do marido, que foi baleado dez dias antes da cena inicial do filme e continua com a bala próxima ao seu pescoço. Confrontada com ele em estado vegetativo, sem coragem de abandoná-lo, ela tenta mantê-lo vivo, mesmo que tenha que se esconder dos mais diversos ataques e enfrentar condições adversas, como a falta de remédio para ele e de água. 
Essa coprodução do Afeganistão com a França, Inglaterra e Alemanha, como todo filme rodado em país árabe que repercute internacionalmente, é uma experiência rica nos costumes de outra cultura, muito diferentes da Ocidental. Em “A Pedra da Paciência”, o foco são no papel da mulher na família e na sociedade, ao focar na relação da protagonista com o seu marido. Aproveitando que ele só a escuta, talvez nem isso, a personagem desabafa, contando para ele detalhes de sua vida e de seus sentimentos que o esposo nem sequer suspeitava. Não é à toa: o casamento arranjado deles foi de uma frieza chocante, e os dez anos em que estiveram casados não parecem ter sido diferentes. 
O roteiro amarrado dosa bem as confissões da personagem, sempre muito interessantes, com um detalhe novo de sua história e ou de seus sentimentos. O estado de sítio na região interrompe várias vezes a confissão, adicionando muito suspense à trama, que recorre à trilha sonora propícia para acentuar essa sensação, em alguns momentos. 
Quando um jovem soldado entra em cena, o filme vai ainda mais fundo na discussão da presença da mulher na sociedade muçulmana. Tal personagem traz uma reviravolta para a trama e apresenta a problemática do desejo, deixando-o aflorar, para o bem ou para o mal. É o ponto que parece mais ousado no filme, levando em consideração o primeiro e brutal ato desse homem. Entretanto, não é a primeira vez que o sexo aparece no filme, já que é um ponto de tensão não só no casamento da protagonista, mas na relação dela com os irmãos do marido.
O desfecho do filme pode até ser previsível (seu “grande segredo” estava na cara antes da metade do filme), mas é carregado de tensão. “A Pedra da Paciência” termina em seu clímax, deixando o público um tanto perplexo, o que é intencional. Trata-se, em suma, de um filme envolvente do começo ao fim. O público, no fim das contas, não deve precisar exercitar muito a paciência para assistir a essa obra.

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