Miss Violence



Por Gabriel Fabri

Os efeitos da crise de 2008 foram pouco sentidos no Brasil, que apesar do baixo crescimento econômico, vê os jovens entrando nas faculdades, a miséria diminuindo e o emprego aumentando. É o contrário da situação que acontece na Grécia e vem se arrastando ao longo de todos esses anos. O país mais afetado pela crise passa por maus bocados e segue a cartilha de combate neoliberal, com as chamadas medidas de austeridade. Austeridade é a palavra-chave para descrever “Miss Violence“, longa-metragem grego dirigido por Alexandro Avranas. A frieza e a rigidez dos personagens principais é o que torna o filme um grande soco no estômago do espectador. 

O longa-metragem se inicia com uma cena icônica, que com certeza ficará marcada na memória do público. Trata-se de uma festa de família, o aniversário de 11 anos de uma bela garota que não sorri. Um pequeno indício de que algo está errado nessa comemoração. A sensação se confirma com o sereno suicídio da aniversariante, encerrando a festinha. A partir desse momento, o filme mostra como a família tenta se reerguer, ou melhor, manter suas aparências, após o fatídico episódio.
Aos poucos, o espectador vai conhecendo a família, e cada vez mais, entendendo os seus podres. E a medida que adentramos esse cenário em profundidade, mais apreensivo fica o longa, quase um filme de horror, mas sem nada dos clichês do gênero. Os personagens não são aprofundados, pois são suas atitudes, ou a falta delas, que importam para a trama. Destacam-se a falta de comunicação entre os personagens e a violência cotidiana entre eles, por meio de tapas espontâneos e punições severas, em nome da “ordem” e da “educação” das crianças (após o suicídio da cena inicial, sobram uma adolescente e ainda uma menina e um menino). A Grécia está em crise, sem empregos, e a austeridade – em um nível mais do que radical de maldade – parece ser também a maneira encontrada para contornar a situação nessa família.
Com planos longos e fixos, uma paleta de cores frias e atuações sinistras, o filme mantém por toda a projeção um clima de desconforto contínuo, acentuado pela ausência da trilha sonora (os sons do filme são todos ambientes – a música da televisão e do rádio, o barulho do aspirador de pó, são exemplos inquietantes) e pelo foco nos toques entre os personagens. Em um núcleo familiar em que as relações são frias e hostis, o toque de um personagem em outro está sempre em evidência pela câmera, um detalhe que pode parecer banal, mas que imprime toda uma força no contexto. 
“Miss Violence” se sai muito bem em tudo o que pretende: na criação de um ambiente opressor, nas duras surpresas que reserva, no retrato de uma família em crise, um paralelo com um país em crise, e, por fim, no efeito que tudo isso pode causar no espectador que, certamente, sairá mexido dessa experiência cinematográfica. 
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