Olhos da Justiça
Ganhador do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2010, o argentino O Segredo dos Seus Olhos, longa-metragem de Juan José Campanella estrelado por Ricardo Darín, ganhou uma refilmagem hollywoodiana. Trata-se de Olhos da Justiça (que em inglês manteve o título original Secret in Their Eyes), com direção de Billy Ray, roteirista de filmes como Jogos Vorazes e Capitão Phillips. Embora remakes de filmes estrangeiros recentes tenham fama de servirem apenas para lucrar mais em torno de uma boa história no mercado norte-americano, o longa-metragem de Ray faz mudanças interessantes com relação a obra original.
Muitas cenas, piadas e a reviravolta do desfecho continuam as mesmas na nova versão, mas há algo substancialmente diferente no remake. A vítima do estupro seguido de assassinato não é mais a esposa de um homem comum, e sim a filha de Jess (Julia Roberts), uma colega de trabalho e grande amiga de Ray (Chiwetel Ejiofor). Os dois trabalham juntos em uma célula anti-terrorista da polícia de Los Angeles. Pelas fotos de um churrasco do departamento, Ray identifica o principal suspeito: um informante da unidade sobre as atividades de uma célula terrorista da cidade. Estamos aqui em 2002, quando o 11 de Setembro ainda era uma ferida muito aberta no cotidiano do mundo inteiro, em especial nos Estados Unidos.
Só o fato do investigador estar emocionalmente envolvido com a mãe da vítima (e, por sinal, conhecer bem a menina assassinada), já é um ponto que agrega à trama e aos personagens nessa nova versão. Além disso, Jess e Ray trabalham juntos, o que torna também mais interessante as relações de Ray com a nova garota do departamento, a elegante Claire (Nicole Kidman), e toda a condução da investigação. O trio tem química e os personagens funcionam bem – Roberts, no papel da mãe abalada com a morte da filha, entrega uma excelente atuação, enquanto Kidman surpreende em uma cena que é praticamente idêntica à do longa-metragem original: o interrogatório do principal suspeito, após ela perceber que ele, nada indiscretamente, observa o decote de sua blusa.
Outra mudança interessante é que, no presente, Ray resolve reabrir as investigações. Ou seja, nada de breves reflexões sobre o passado para escrever um livro. Há ação também com as pistas de um novo suspeito, que a intuição do protagonista indica ser o assassino que deixaram escapar 13 anos antes. Muitas feridas sendo reabertas, com Jess, a mãe da vítima, acompanhando de perto o caso. Detalhes que tornam o desfecho e a sua reviravolta ainda mais impactantes.
Quem assistiu a O Segredo de seus Olhos pode reclamar da falta do humor argentino – que bom que não quiseram copiá-lo! – ou talvez da falta de sutileza da versão norte-americana. Afinal, o detalhe do título, os flertes, os olhares nas fotos, que no filme de Campanella são tão marcantes em alguns momentos não estão presentes aqui, assim como a cena poética do trem, da despedida. Mas tudo bem: embora tenha uns exageros estranhos (Uma stripper com quadros gigantes de peitos em sua casa? Um policial manco que se atira de uma altura ridiculamente alta para forçar algum humor?), Olhos da Justiça tem as suas qualidades. Funciona muito bem, principalmente para quem não viu o filme argentino e não sabe, ou esqueceu, a surpresa que o aguarda no final.
| Gabriel Fabri