Mulheres Divinas

O ano era 1971 e a Suíça realizava uma consulta popular sobre o direito das mulheres ao voto. Em um vilarejo do país, entretanto, não havia discussão alguma sobre o tal referendo ou sobre os direitos das mulheres. Até que uma delas resolveu mudar o jogo: Mulheres Divinas, de Petra Biondina Volpe, conta esse pequeno episódio sobre como vencer a resistência de uma sociedade patriarcal em rever os seus valores e costumes. O longa-metragem foi o escolhido pela Suíça como o seu representante na corrida ao Oscar 2018.

Que a votação naquele vilarejo seria totalmente contrária ao direito ao voto para as mulheres era fato consumado. Afinal, a única mulher engajada no assunto era a líder contrária a ele, uma poderosa senhora que acreditava ser um privilégio das mulheres cuidarem de suas casas. Os homens, os únicos que poderiam votar a respeito do assunto, concordavam com ela – e Hans (Maximilian Simonischek) é até notificado de que receberia um aumento por liderar o voto de todos contra esse direito. Mas a esposa de Hans pensa diferente: dona de casa,  Nora (Marie Leuenberger) jamais havia falado qualquer coisa sobre o assunto. Mas, ao sentir vontade de voltar a trabalhar e não receber a permissão do marido, necessária por lei, ela percebe que o sistema é injusto, e resolve tomar uma atitude para mudá-lo.

O longa-metragem retrata situações e mentalidades que hoje, passados quase meia década depois, são consideradas absurdas. Além de retratar uma mentalidade ultrapassada, o que Mulheres Divinas e outros filmes sobre feminismo como o polonês A Arte de Amar (exibido, assim como Mulheres Divinas, na 41ª Mostra Internacional de Cinema) mostram é importante para deixar uma reflexão sobre os dias de hoje – que comportamentos e valores e leis que temos ainda são frutos dessa mentalidade da época?

Para passar essa mensagem, o longa-metragem inclui a personagem Vroni (Sibylle Brunner), uma senhora idosa que se arrependeu de ter tomado partido contra o direito ao voto em outra ocasião. A amizade entre ela e Nora traz leveza ao filme, ao mesmo tempo em que ela funciona como uma espécie de conselheira da protagonista. Além disso, o roteiro se desenvolve em cima de uma estrutura maniqueísta, que configura aquela sociedade basicamente na divisão entre mulheres oprimidas e homens opressores, com algumas nuances, como o bom marido no caso de Hans, que aos poucos assume uma postura um pouco mais compreensível ao tema da emancipação feminina.

O que talvez torne  Mulheres Divinas mais interessante e inspirador é a constatação de que pequenas coisas fazem a diferença. Isso pois é muito provável que aquele vilarejo não tivesse a menor importância, numericamente falando, no resultado final do referendo. Mesmo assim, as mulheres retratadas colocaram suas vidas confortáveis em risco para serem ouvidas e, por meio de uma discussão política que é de todo um país, dão passos em direção a uma vida melhor para elas. O direito ao voto na Suíça só seria concedido 20 anos depois. Entretanto, elas ganharam muito mais do que isso por erguerem a voz e lutarem essa pequena batalha na sua comunidade.

Por Gabriel Fabri 

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