Kong: A Ilha da Caveira
Após Peter Jackson refilmar a história de King Kong em 2005 (o original era de 1933), com a tecnologia de ponta que permitiu obras como Senhor dos Anéis saírem do papel, parecia que o animal tinha ganhado o seu filme definitivo – talvez por um bom tempo. Eis que o gorila gigante ganhou uma nova história para as telas em Kong: A Ilha da Caveira. Com direção de Jordan Vogt-Roberts, o longa-metragem tem elenco encabeçado pela vencedora do Oscar Brie Larson (O Quarto de Jack) e por Tom Hiddleston (Thor).
Uma vez que a descoberta de uma nova ilha no século XXI parece um tanto improvável, o filme se ambienta na década de 1970, bem ao término da guerra do Vietnã. Com a moral baixa, após o desastre da intervenção norte-americana, políticos e militares estadunidense vêm na descoberta de uma nova ilha uma possibilidade de um novo território para explorar, quem sabe descobrir uma planta que cure o câncer – antes que os russos descubram, claro. Fotojornalista, Mason (Larson) percebe que há algo de errado nessa operação, e resolve se candidatar para fazer uma cobertura fotográfica. Hiddleston interpreta James Conrad, um ex-fuzileiro contratado para guiar a expedição. Chegando lá, percebe-se que a viagem era um delírio de um cientista que queria provar a existência de monstros – e, bom, se saírem vivos de lá, terão muitas histórias para contar.
Com personagens vazios, Larson e Hiddleston são ofuscados em seus papéis de mocinho e mocinha do filme. Torcemos por eles porque o longa-metragem coloca-os no centro das atenções, são os “bonzinhos” da história, mas, no fim das contas, eles não fariam muita falta – um desperdício de talento de uma atriz que entregou uma atuação tão impactante em O Quarto de Jack. Ao contrário da Jane (Margot Robbie) de A Lenda de Tarzan, que tinha um protagonismo forte e ganhava destaque em uma selva predominantemente masculina, a personagem de Larson é um zero à esquerda, a grande decepção do filme. Os coadjuvantes, entretanto, carregam o filme nas costas.
O vilão caricato e de ego inflado e dolorido de Samuel L. Jackson mostra o quanto as pessoas podem voltar idiotas de uma guerra sem sentido, ainda mais quando derrotadas: sob um discurso falsamente humanista, de salvar a vida de um soldado, o general Preston prefere arriscar a vida de todos para ter a chance de satisfazer um desejo de vingança; a raiva que o pública possa vir a sentir de Jackson, afinal está na cara que cruzar a selva é uma ideia ridícula e que suas intenções não são nobres, é aumentada com o fato de que é difícil se lembrar qual é o personagem que ficou perdido (não é só o casal principal que é mal desenvolvido…). Jackson pode parecer exagerado e maniqueísta demais, mas funciona, uma vez que coloca em enrascada os personagens e os dividem, acrescentando algumas reflexões sobre o ser humano e a sua dificuldade de perder e até de ser racional, debaixo de um verniz falso-moralista.
Com o papel de Marlow (John C. Reilly), um soldado que estava há quase 30 anos na ilha, o filme ganha um toque de humor e personalidade, sendo a pessoa com quem mais simpatizamos na trama. Mas a estrela de verdade é Kong, o personagem que, após nos sentirmos ameaçados por ele, vamos aprendendo a gostar dele, ainda mais depois que descobrimos sua história. E a identificação que o filme provoca com o casal protagonista vem justamente por essa simpatia pelo monstro, que acaba revelando-se uma vítima dos humanos e de outros monstros – Kong é, portanto, o locus da virtude melodramática do filme, o herói e a vítima ao mesmo tempo.
Kong: A Ilha da Caveira é um filme com muita ação e adrenalina e consegue bons momentos também de suspense. Mesmo com uma cena final um tanto desnecessária, uma cena pós-créditos duvidosa, e tendo um casal de protagonistas do mais esquecível, o longa-metragem surpreende com a agilidade e vigor que resultam de suas qualidades técnicas e narrativas. Não é inovador, apesar de às vezes caprichar na violência ou mesmo no toque de humor negro, mas é um bom entretenimento.
Por Gabriel Fabri