Por Gabriel Fabri
O último álbum de Miley Cyrus, Can’t Be Tamed, apresentava o começo de uma reviravolta na carreira da ex-Disney. Após o sucesso estrondoso do seriado Hannah Montana e grandes hits como Party In The USA e The Climb, a cantora mandou um recado em alto e bom som: “eu não posso ser amarrada”. Liberty Walk, a faixa que abre o seu segundo CD, aconselhava dizer “adeus para as pessoas que amarraram você”. A fase rendeu dois clipes e uma turnê nanica, que passou pelo Brasil (e não pelos EUA), mas simbolizou algo muito maior: o tal adeus à imagem de garotinha comportada. Com seu terceiro álbum de estúdio, Bangerz, Miley volta à ativa, com nova gravadora, novo visual e um som diferente, mas que não perdeu a essência pop.
Em Bangerz, Miley não tem, aparentemente, mais nada que a impeça de cantar o que vêm a sua cabeça. O carro chefe We Can’t Stop leva a Miley festeira de outrora a um novo patamar. Ela canta sobre cocaína, sobre rebolar como num clube de striptease e sobre fazer o que quiser – e já manda um recado contra o recalque: esqueça quem te odeia e lembre-se que só Deus pode julgá-lo. Cyrus, enterrando de vez a lembrança da sua personagem da Disney, realizou ao lado de Robin Thicke a performance do VMA mais polêmica dos últimos tempos. O sucesso da música e do segundo single, Wrecking Ball (lançado no mesmo fim de semana da apresentação), mostram que a mudança de Miley foi, finalmente, aprovada, mesmo que em meio a muita polêmica.
Todavia, contrariando quem esperava a mulher festeira logo de cara, a primeira faixa de Bangerz é uma deliciosa balada. I Adore You é uma canção de amor bem simples, mas muito bela. Miley afirma que começou a viver só agora e mostra uma faceta mais frágil diante da poderosa do primeiro single que, por sinal, já é a faixa seguinte.
Um parenteses na análise de Bangerz. A segunda faixa de trabalho do novo álbum da veterana Cher, que estava há 12 anos sem um novo lançamento, é justamente uma regravação de uma balada de Cyrus – a pouco conhecida I Hope You Find It, que integra a trilha do filme A Última Música. A voz potente de Miley é, inegável, perfeita para baladas. Entre os sucessos de Miley, está When I Look At You e The Climb, só para citar algumas. Quando Miley veio para São Paulo, a plateia gritava enlouquecida para que ela cantasse Stay, uma preciosidade do álbum Can’t Be Tamed.
Essa digressão sinaliza que ótimas baladas vindas de Miley não são novidades. São, inclusive, o ponto forte de Can’t Be Tamed. Em Bangerz, elas não são postas de lado. Pelo contrário: Wrecking Ball é disparada a melhor música do álbum. A força da voz de Miley e da letra dão a impressão de que a faixa tem um poder destruidor sob o ouvinte. Aquele som que deixa triste a pessoa mais alegre, mas dá forças para extravasar o que é guardado dentro de todos. É a destruição de barreiras internas. Miley demole todas as suas com essa música e tem o momento mais vulnerável de sua carreira nessa canção. Por meio da destruição, o renascimento. Por essa metáfora, Miley transcende sua personagem Disney para consolidar a sua nova imagem.
E que nova imagem é essa? Uma leitura superficial apontaria para uma rebelde que só quer causar. É apenas uma faceta, bastante evidente no novo trabalho. Em 4×4, parceria com o rapper Nelly que lembra a divertida Hoedown Throwndown (canção country do filme Hannah Montana), ela já afirma ser exatamente isso, uma rebelde. No dueto um tanto monótono com Britney Spears, SMS (Bangerz), e na canção Love Money Party (com Big Sean), ostentação (até certo ponto, já que a segunda critica exatamente isso) e atitude definem a nova Miley. Essas duas músicas são divertidas e apontam uma sonoridade completamente nova para a cantora, mas são os pontos fracos: momentos que devem passar batidos na audição.
Os destaques do álbum são mais interessantes do que isso. #GETITRIGHT tem uma sonoridade ímpar (a música flerta com o reggae) dentro do disco e uma letra contagiante e até que bem comportada (apenas com relação à linguagem), para uma canção que fala abertamente sobre sexo, desejo e o corpo feminino. É para cantar com os amigos à beira do mar, como no clipe de We Can’t Stop, e se a gravadora for experta, deverá lançá-la muito em breve. Soa natural e original. My Darling, parceria com o rapper Future (está também no último álbum da Rihanna), parece uma versão moderna e urbana do clássico de Ben E. King, Stand By Me, e traz um dueto hipnotizante. Para encerrar o álbum, Someone Else, uma canção bem eletrônica cuja sonoridade lembra Who Owns My Heart, o segundo single de Can’t Be Tamed, e que sintetiza o espírito do álbum: Miley virou outra pessoa. De resto, vale a pena ressaltar FU e Do My Thang. Ótimas canções, radiofônicas e grudentas, também totalmente alinhadas com a imagem da Miley emancipada e poderosa.
Bangerz é um excelente álbum e um divisor de águas na carreira de Miley Cyrus. A cantora está antenada aos hits do momento – com o pop flertando com o R&B, o hip hop e a música eletrônica -, e o novo CD é um prato cheio deles. O caminho traçado por Miley até agora é de cartas marcadas (Britney e Aguilera, só para citar as mais conhecidas, também passaram por processo semelhante, usando as mesmas fórmulas de agora), mas esse é o primeiro passo para ela firmar-se com relevância no mundo pop. E a receita de bolo, infalível, é seguir na cola de quem mais faz sucesso hoje em dia: Rihanna. A diferença é que Bangerz é um pouco mais pop e um tanto mais divertido que os últimos dois álbuns da cantora de Barbados.