Maria do Caritó: “Todos querem acabar com a Secretaria de Cultura”, afirma Lilia Cabral

Longa-metragem Maria do Caritó não faz críticas diretas ao governo federal, segundo Lilia Cabral

Em uma cidadezinha do interior do Brasil, um político usa da fé das pessoas para tentar se eleger prefeito. Ele leva ao comício Maria do Caritó (Lilia Cabral), uma suposta santa que supostamente faz milagres. Na verdade, já na menopausa, Maria ainda é virgem, pois foi prometida pelo pai a um santo, mas sofre com isso. Ela é o orgulho da cidade, mas não de si mesma, e o político tenta usá-la a seu proveito. Sua única promessa real de campanha, do que foi expresso no comício, é proibir o circo itinerante que está presente na cidade.

Maria do Caritó é um filme é muito delicado e sincero, aborda com poesia as questões”, define o diretor João Paulo Jabur. “O personagem fala que quer acabar com a Secretaria de Cultura, mas o nosso filme foi feito há alguns anos, para você ver como as coisas estão aí, são recorrentes, pouco mudou”. A atriz Lilia Cabral completa. “Todos querem acabar com a Secretaria de Cultura, entra governo e sai governo. A gente, então, vai se renovando, o que a gente pode fazer?”. O longa-metragem foi filmado em 2017, antes da eleição de Bolsonaro – entretanto, Temer, naquela época, já havia tentado extinguir o Ministério da Cultura. Lilia Cabral garantiu que não há referência nenhuma ao governo e que a peça teatral, que chegou aos palcos em 2010, já tinha as mesmas críticas.

Sobre o projeto, Lilia Cabral foi bastante reticente quanto a transformar a peça de Newton Moreno em filme. “A gente nunca sabe o momento certo e o momento certo é a hora na qual a gente diz sim”, conta a atriz, que também é produtora. Já com mais 50 anos, ela achava que deveria fazer um clássico, e ficou procurando textos de Federico García Lorca. “Um dia chega a Maria do Caritó, peguei o Lorca e falei: ‘meu querido, não vai ser agora, vou me transformar em uma palhaça'”, conta. “O Lorca, a densidade dramática faria com que as pessoas acreditassem, mas a palhaça era muito mais desafiadora.”

A atriz conta que desejava fazer com que Maria do Caritó fosse um filme com o qual as pessoas se identificasse. “Um filme que as pessoas falassem, ah! como é lindo, como é brasileiro!“, conta. “Que elas pensassem: olha, eu já fiz aquela simpatia.”

Para o roteirista José Carvalho, que escreveu o texto junto com o autor da peça, o filme mistura dois gêneros com origem popular, na ópera. “A presença do circo com o melodrama é o que define o filme”, conta. O roteiro, entretanto, tem suas diferenças com a peça, incluindo um final fora do padrão das comédias românticas. “É a fé em si mesma”, define Carvalho. “Aqui no Brasil, o Estado é laico, mas o imaginário não. Esse desfecho mostra que de fato a gente pode ter um estado laico”, conclui.

Newton Moreno completa definindo o filme como um ensaio sobre a fé. “É a palhaça santa”, define. “Ela tem a devoção, mas tem o fogaréu debaixo da saia.”

Por Gabriel Fabri

Confira o trailer de Maria do Caritó:

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