O Expresso do Amanhã
Só que não foram selecionados dois animais de cada espécie, e sim indivíduos de três classes sociais – a elite, a classe média e a classe trabalhadora. E eles não se misturam no trem, com exceção dos guardas que entregam as barras de proteínas (a única comida destinada aos mais “pobres”) e a Ministra (Tilda Swinton), que vem dar as lições de moral para os membros dos vagões traseiros. No cenário do “trem da vida”, tudo remete à morte, e de alguma forma os miseráveis deveriam ser gratos por isso. Mas Curtis (Chris Evans) não é, e planeja, com o amigo Edgar (Jamie Bell), uma revolução: tomar o controle do trem das mãos de Wilford (Ed Harris), dono da empresa que construiu o veículo.
Até mais ou menos a metade da projeção, O Expresso do Amanhã parece mais um filme distópico, sem muito a oferecer. Pobres oprimidos, mantidos miseráveis pelo bem material de poucos, em um futuro desolador. O problema é que fica difícil se envolver com os personagens e as cenas de ação demoram a empolgar, ainda mais com a interpretação exagerada de Swinton como uma das vilãs, que reforça o maniqueísmo dos “ricos contra os pobres” sem muita sofisticação. Mas, na medida em que os personagens avançam nos vagões, em direção à parte mais nobre, o longa-metragem começa a ficar interessante.
A sequência do “vagão-escola”, em especial, é brilhantemente bizarra e, a partir daí, o filme decola com um clímax que mostra o quanto a realidade do trem é próxima à nossa realidade, e o quanto as duas são cruéis, colocando em dúvida o protagonista sobre o futuro do trem. Além do mais, uma confissão emocionante de Curtis traz o que faltava, um pouco de vida aos personagens. Sem falar nada sobre o passado e sem perspectiva para o futuro, os indivíduos da traseira do trem são quase zumbis, e, bom, embora isso reforce o quão cruel é a ditadura do trem, é difícil para o espectador se envolver com personagens rasos, sobre os quais pouco foi apresentado.
Dirigido pelo coreano Bong Joon-ho, O Expresso do Amanhã é um filme irregular, mas tem conteúdo. O grande acerto aqui talvez seja trabalhar o personagem de Curtis não como um herói, mas como uma peça da engrenagem do sistema, como todos os outros, por mais que ele seja o líder. Isso torna o longa-metragem mais duro, mas o torna também mais real.