Love 3D
Por Gabriel Fabri
Quando Lars Von Trier lançou o seu Ninfomaníaca, o frenesi em torno do longa-metragem foi grande, embalado no marketing que focava no conteúdo de sexo explícito do filme. Tratando-se do diretor dinamarquês, que é persona non grata no Festival de Cannes, pode-se esperar de tudo, menos um produto genérico, comum. Trier brincou com a expectativa do público e lançou um filme provocativo, sim, mas melancólico, diferente do “pornô de arte” esperado. Em Love 3D, que chega aos cinemas nesta quinta-feira (dia 10), Gaspar Noé, diretor do polêmico Irreversível (2002), tentou seguir a mesma linha. O resultado, entretanto, é bastante inferior.
Na trama, Murphy (Karl Glusman) é um aspirante a cineasta. Na manhã do ano novo, ele recebe uma mensagem inesperada. A mãe de sua ex-namorada deixa um recado em seu celular, dizendo que não tem notícias de Electra (Aomi Muyock) há dois meses. Insatisfeito com o relacionamento com sua esposa Omi (Klara Kristin), Murphy entra em crise, com saudades de Electra e com o receio de que ela tenha se suicidado.
O longa-metragem conta a história de Murphy e esses seus dois relacionamentos de maneira totalmente não linear, entrecortada. A montagem funciona bem, fazendo a história, que é muito simples, ficar interessante, entregando um detalhe de cada vez, de uma maneira estilosa. Em um instante, por exemplo, Murphy está em seu quarto com luz vermelha e com posters de clássicos do cinema como M – O Vampiro de Düsseldorf, de Fritz Lang, e Saló ou os 120 Dias de Sodoma, de Pier Paolo Pasolini. No segundo seguinte, o público vê o mesmo quarto, agora completamente sem personalidade. E o que sobrou do personagem, em seu casamento forçado pela gravidez de Omi, foi um pouco de ópio, que ele mantém escondido em uma embalagem de fita cassete, e uma maquete sugestiva de um tal de Love Hotel (um detalhe insignificante e que se revela uma simples brincadeira com o nome do longa-metragem).
Além da montagem, Love se destaca pela trilha sonora, que embala as cenas explícitas de sexo. Assim como em Ninfomaníaca, o sexo não está presente para excitar o espectador. Love também é melancólico, triste, e embora as cenas aqui sejam mais sensuais que no filme de Lars Von Trier, Gaspar Noé não deixa a sensação de tristeza escapar – mesmo levando em conta que quase todas as cenas de sexo sejam momentos felizes do passado do personagem. A trilha sonora reforça essa ambientação sexy e, ao mesmo tempo, melancólica.
As semelhanças com Ninfomaníaca, entretanto, param na questão da tristeza e do sexo. A história em si é bem diferente, o visual também, e em Love há apenas uma tentativa de ser transgressor. Tentativa mal sucedida, por sinal. O recurso em 3D funciona melhor em uma cena que não tem sexo, por exemplo: em uma briga entre Electra e Murphy na balada, as luzes do ambiente saltam da tela, e o resultado é um visual incrível. Fora isso, fica claro que o 3D está aí só para chamar atenção, assim como a tão alardeada cena da ejaculação, com o gozo indo direto na cara do espectador – gratuita, sem nenhum propósito além o de gerar barulho sobre o filme. Há outras coisas desnecessárias, como chamar o protagonista de Murphy em alusão explícita à popular Lei de Murphy, que diz que se algo pode dar errado, dará errado.
Love não é um filme ruim. Fala menos sobre sexo e mais sobre amor, de sua natureza errática, excitante e melancólica. Deixa as pontas abertas e poderia ser um incentivo para o publico refletir sobre os próprios desejos e medos. Mas, ao tentar ser provocador na cena final, o diretor põe tudo a perder. Gaspar Noé não é Lars Von Trier: se o final surpreendente de Ninfomaníaca reinventava todas as cinco horas de projeção anteriores, colocava novas questões no ar e pedia ao espectador uma nova interpretação da história, aqui o desfecho tenta apenas chocar por chocar, enfraquecendo o filme, que termina parecendo uma obra desesperada por atenção.