Zoology (40a Mostra)
Junto com o polonês A Atração, musical com sereias canibais, Zoology provavelmente é o filme com a sinopse mais inusitada dessa 40ª edição da Mostra Internacional de Cinema. Dirigido por Ivan I. Tverdovskiy, o longa-metragem russo conta a história de uma senhora que trabalha em um zoológico. Após sentir uma dor nas costas, Natasha (Natalya Pavlenkova) percebe que cresceu, no seu corpo, um rabo enorme.
É um filme muito interessante e, apesar da premissa, passa longe de ser jocoso. O que Tverdovskiy quer aqui é falar sobre dois temas caros ao mundo de hoje, a aparência e a solidão. Natasha vive enjaulada em um cotidiano sem amor, sem sentido, sem emoção. Já no fim da vida adulta, ela vive apenas com a sua mãe rabugenta e não tem um namorado ou uma amiga sequer. Pior: ainda sofre bullying das colegas de trabalho.
Não se sabe porque cresceu um rabo nela, e a personagem não procura descobrir as causas disso. Mas o fato é que sua vida era tão sem sentido quanto a de um animal no zoológico e acabou que ela de certa forma se tornou um. E o interessante é que logo ela percebe algo de bom nisso tudo: finalmente, Natasha pode ser notada. As pessoas prestam atenção nos animais e agora vão prestar atenção nela. Mas, como ela se tornou (ainda mais) diferente dos padrões sociais, terá que lidar com essa nova realidade – a do preconceito, ou algo mais duro, a sensação de que as pessoas ao redor sentem por você não mais pena, mas repulsa.
Qualquer pessoa que alguma vez já se sentiu rejeitada, ou fora dos padrões, uma pessoa que é ou já foi considerada feia mesmo, vai entender perfeitamente essa metáfora do filme. O rabo é aquela imperfeição que temos, ou que os outros apontam na gente para nos fazer sentir menos confiantes, menosprezados, inferiores. Por isso, é difícil crer no relacionamento estilo “amor à primeira vista” que se desenha no filme, embora o público, desconfiado, certamente irá torcer para o relacionamento da senhora com o técnico de raio X. Zoology é um filme duro sobre aceitação e, em um mundo cruel baseado nas aparências, o final é certeiro. Por mais que a premissa seja fantástica, Zoology é um filme realista, e termina com uma conclusão que provoca, e que é muito real.
| Gabriel Fabri