Mundos Opostos
O crescimento do fascismo, do ódio e da intolerância, escancarado e em escala global, é tema do longa-metragem grego Mundos Opostos, escrito e dirigido por Christopher Papakaliatis. O filme é composto por três episódios ambientados na Grécia, país símbolo da crise econômica que atinge a Europa, e também da crise moral, com a questão dos refugiados. As questões levantadas pelo filme, entretanto, não estão longe de dilemas que vivemos na América como um todo ou no Brasil.
A primeira história é a mais interessante, e só ela poderia render um grande filme. Uma adolescente é salva por um imigrante sírio de uma tentativa de estupro. Os dois se reencontram e começam a ter um relacionamento. Em um período de crise, o discurso de que os imigrantes estão “roubando empregos” e são “parasitas” ou coisa pior é geral, tornando esse simples romance algo polêmico, perto do impossível, ou até mesmo algo subversivo. Ainda mais para alguém com um pai como o da garota, que culpa os imigrantes pelo seu fracasso como varejista. Essa história de amor impossível capta com sensibilidade o mal estar europeu com a crise e com a imigração, de todos os lados. É o ponto forte do longa-metragem.
Em seguida, vemos a chegada da sueca Elise na Grécia, que vem para impor um plano de recuperação a uma empresa, enxugando os números de funcionários. A metáfora é óbvia: Elise é o país do centro econômico europeu que impõe o seu pacote de medidas de austeridade ao país vizinho. Com o discurso da eficiência, da gestão e do corte de gastos, provoca desemprego e agrava a vida das pessoas envolvidas. A empresa é o microcosmo do país que é obrigado a seguir a receita do “remédio amargo”. Qualquer semelhança com a situação do Brasil, cujos algozes são internos e não externos, não é mera coincidência. Para complicar a história de Elise, ela descobre que o homem com quem estava saindo, um pai depressivo prestes a se divorciar, é um dos funcionários da empresa em que vai mexer.
Até aí, o longa-metragem ia razoavelmente bem, tratando com atenção temas importantes e problemas que só devem se agravar, apesar da necessidade de verbalizar coisas demais, abrindo mão de sutilezas. Um ponto positivo, por exemplo, era o fim de cada das histórias ser em aberto, em seu ponto de maior tensão. Na terceira história, porém, o diretor erra a mão na construção de mais um romance. O encontro de um bibliotecário (interpretado por J.K. Simmons) e uma dona de casa soa forçado demais, comprometendo o relativo sucesso com que o longa tinha conseguido envolver o público até então. No meio de toda a crise econômica e moral, o diretor parece desesperado em fazer um final esperançoso, deixando o filme piegas demais. Entretanto, a coisa piora, quando o roteiro resolve juntar todas as histórias em uma só. Fora que esse episódio não agrega muito ao que estava sendo dito anteriormente, além de tentar dar um up na autoestima grega, recuperando histórias da mitologia do país que formaram a cultura ocidental.
Há, ali no final, uma cena de um sermão que pode fazer o público vibrar. Entretanto, nesse ponto, Mundos Opostos já tinha perdido toda a sua força, revelando sua fraqueza. É importante, porém, fazer uma observação entre esses três romances, todos envolvendo um grego e um estrangeiro: apenas o romance com o imigrante sírio incomoda os gregos, mesmo o alemão e a sueca também trabalhando no país (vejam bem, a sueca acaba com muito mais empregos, e, apesar de olhares tortos, ninguém aponta arma para ela). Esse preconceito todo, essa seletividade moral do discurso fascista, poderia ter sido confrontado, por exemplo, na hora de unir as três histórias. Mais um exemplo do potencial desperdiçado do filme.
| Gabriel Fabri