A Grande Jogada – Crítica
Habilidoso roteirista da série The West Wing e dos filmes Steve Jobs e A Rede Social, Aaron Sorkin faz sua estreia na direção com o longa-metragem A Grande Jogada. Indicado ao Oscar de Melhor Roteiro, o filme é inspirado na autobiografia de Molly Bloom, uma ex-competidora de esqui que se tornou a chamada “Rainha do Poker” – uma empresária que organizava jogadas de poker exclusivas que reuniam estrelas do rock, mafiosos russos e astros de Hollywood, como Ben Affleck, Tobey Maguire e Leonardo DiCaprio.
Já na primeira cena, Sorkin estabelece uma forte conexão com a protagonista, interpretada por Jessica Chastain. A narração em off pela personagem, um recurso que aproxima o público de Molly desde esse início, começa questionando a pior coisa que poderia acontecer em um esporte, deixando a audiência instigada para o que viria a seguir. Em uma licença poética de Sorkin (o acidente retratado nunca aconteceu), essa introdução engrandece a personagem no sentido de que ela teria sido forçada a se reinventar, logo, uma mulher que não se dobra às dificuldades do destino. Também estabelece a protagonista como uma pessoa esforçada, metódica, e também sarcástica, características que são reforçadas ao longo do longa-metragem.
Ao contrário do genial Steve Jobs, que não pintava uma visão muito agradável do biografado, A Grande Jogada coloca-a como uma heroína que foge dos clichês. A produção não poderia ser diferente: além de se pautar pela sua autobiografia, ela nasceu da iniciativa da própria Molly. A empresária precisava de dinheiro para pagar sua sentença e batalhou para o livro virar filme – a história é espinhosa por envolver o nome de muitos astros de Hollywood, nomes que ela nunca revelou (os conhecidos se tornaram públicos por causa de um vazamento de um depoimento). Para proteger as personalidades reais, o roteiro usa codinomes, mas a revista Time parece indicar quer o Player X (Michael Cera) é de alguma forma inspirado em Maguire.
Apoiado na atuação e narração cativantes de Chastain, o filme ainda conta com o personagem do advogado Charlie (Idris Elba), de suma importância para a trama. Criação de Sorkin, ele tem o papel de verbalizar a defesa da personagem principal, além de questioná-la, provocá-la, ao longo de toda a narrativa. Basicamente, ele faz todas as perguntas e suposições que o público poderia pensar para duvidar da heroína, o que fortalece a imagem de Molly e a conexão com ela. A química entre os dois personagens flui bem e é um ponto alto do filme, que também acerta ao explorar a relação da personagem com o pai, Larry (Kevin Costner).
Em um ano marcado pelas denúncias de assédio sexual em Hollywood, é surpreendente (ou talvez não) que a Academia não tenha dato tanta atenção a A Grande Jogada. Apesar de não falar sobre o tema da vez, o filme é protagonizado por uma mulher forte e autêntica, e expõe um submundo frequentemente machista de alguns dos homens poderosos da indústria. Além de ser de uma qualidade impressionante. Mas, como sempre, a indústria vai preferir esse ano a fantasia e o romance de A Forma da Água ou os dilemas adolescentes de Lady bird do que cutucar as suas próprias entranhas.
Por Gabriel Fabri
Confira o trailer do filme clicando aqui.